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27 dezembro 2008

What is art??

Sobre Arte


Ententer o que é arte é uma das tarefas daqueles que se entregam a esse ofício. Ao meu ver, arte é entrega, dedicação. Entrega, no sentido do que é mais íntimo e subjetivo e pertencente a alma. O que define um artista, senão esta sua possibilidade de gôsto e prazer pela vida, incluindo todas as suas angústias e indagações, e o quanto ele reflete sobre seus conteúdos.
Sabemos que Michelângelo foi um genio mas porque o foi? Eu acredito que ele o fez por amar a vida. O quanto desta porção está em seu trabalho, nesta entrega. O “ser” artista está saber entregar-se e, no que de sua personalidade faz de mais autêntico.
Autêntico e sincero, no sentido de intuir uma emoção verdadeira, criativa e inteira naquilo que se faz, mas não é apenas a emoção que move todo um sonho, essa autenticidade está em agir , na ação de levantar o pincel e construir.

Arte é vida amorosa em estado permanente de paixão ,que se prolonga em afetos e desafetos, em razões e argumentos a este amante incrustado de exigências.
Há artistas que gostam do que fazem, mas há os que amam, se apaixonam e morrem por seu amor. E arte é movida por esta busca, saber-s e encontrar dentro de si esse algo verdadeiro, puro, essencial e só seu.

Arte não é apenas o que se vê em museus, galerias, vitrines. Arte é este amor que se lapida toda manhã, que se coloca naquilo que se faz e o diferencia, porque arte é um amante exigente, precisa de vocação e empenho, liberdade de ser e sentir, é sempre sútil e delicada, porque não é técnica ou aprimoramente, não é racional no sentido apenas do pensamento, mas é sempre algo que existe nos meandros de nossa personalidade e nos alimenta, e se manifesta como autenticidade.

E, desta autenticidade, creio eu, que se faz arte. Porque arte é como um amante, uma marca, um símbolo de encontro com o si-mesmo e o manifestado ,e portanto construído deste encontro.
Um desenho, por exemplo, pode ser bom, não porque ele é perfeito ou pleno de técnicas , mas porque nele enxergamos algo verdadeiro, e nisto ele é belo e inexplicável, porque a relação amorosa do objeto e do artista se fundem e interagem neste vir a ser arte, e transmite este algo que é este misto
de amor e ação.
~~
texto e colagem: JU Gioli

26 dezembro 2008

Ceia

By José Saramago



Há muitos anos, nada menos que em 1993, escrevi nos "Cadernos de Lanzarote" umas quantas palavras que fizeram as delícias de alguns teólogos desta parte da Ibéria, especialmente Juan José Tamayo, que desde aí, generosamente, me deu a sua amizade. Foram elas: "Deus é o silêncio do universo, e o homem o grito que dá sentido a esse silêncio". Reconheça-se que a ideia não está mal formulada, com o seu "quantum satis" de poesia, a sua intenção levemente provocadora e o subentendido de que os ateus são muito capazes de aventurar-se pelos escabrosos caminhos da teologia, ainda que a mais elementar. Nestes dias em que se celebra o nascimento do Cristo, outra ideia me acudiu, talvez mais provocadora ainda, direi mesmo que revolucionária, e que em pouquíssimas palavras se enuncia. Ei-las. Se é verdade que Jesus, na última ceia, disse aos discípulos, referindo-se ao pão e ao vinho que estavam sobre a mesa: "Este é o meu corpo, este é o meu sangue", então não será ilegítimo concluir que as inumeráveis ceias, as pantugruélicas comezainas, as empaturradelas homéricas com que milhões e milhões de estômagos têm de haver-se para iludir os perigos de uma congestão fatal, não serão mais que a multitudinária cópia, ao mesmo tempo efectiva e simbólica, da última ceia: os crentes alimentam-se do seu deus, devoram-no, digerem-no, eliminam-no, até ao próximo natal, até à próxima ceia, ao ritual de uma fome material e mística sempre insatisfeita. A ver agora que dizem os teólogos.
~~

20 dezembro 2008

Mensagens

To see a world in a grain of sand
and a heaven in a will
flowers,
Hold infinity in the palm of your hand
and
eternity in an hour.
A robin redbreast in a cage
Puts all heaven in a rage.
William Blake

12 dezembro 2008

Poemas

Pintura

Olho para a parede descascada.
Uma fissura.
Confusão de ruídos na rua.
Olho através dos pensamentos.
Diálogos entre as sombras
Dos espaços brancos.
Nos dedos revolvo a menta,
Rotação rítmica dos secos
Sons das folhas.
No ar gira e explode as
Labaredas do fogão.
Sinto-as.
A dança dos bálsamos
No ar.
Novo dia à frente
Respiro ao vento.
Novas memórias.
Janelas abertas e os meus olhos
Saem.
A luz ainda cinzenta, gris, muito
Leve...
Debruçam-se na atmosfera.
A toalha aberta sobre a mesa.
Vejo as fagulhas dos olhos
As pinceladas das águas na pia.
Líquen cor de anil.
Uma escada que sobe e eu subo
Com elas,
Levando todo o poema pelas
Horas, que bebo do meu chá.


Jugioli

20 outubro 2008

Poema

Motion By Octavio Paz
If you are the amber mare
I am the road of blood
If you are the first snow
I am he who lights the hearth of dawn
If you are the tower of night
I am the spike burning in your mind
If you are the morning tide
I am the first bird's cry
If you are the basket of oranges
I am the knife of the sun
If you are the stone altar
I am the sacrilegious hand
If you are the sleeping land
I am the green cane
If you are the wind's leap
I am the buried fire
If you are the water's mouth
I am the mouth of moss
If you are the forest of the clouds
I am the axe that parts it
If you are the profaned city
I am the rain of consecration
If you are the yellow mountain
I am the red arms of lichen
If you are the rising sun
I am the road of blood









"Motion/Movimiento" By Octavio Paz, Translated by Eliot Weinberger, from COLLECTED POEMS 1957-1987, copyright ©1986 by Octavio Paz and Eliot Weinberger.



Moção de Octavio Paz ~

.
Se você é o mar de âmbar
Estou a caminho de sangue
Se você for a primeira neve
Eu sou quem te ilumina o coração do amanhecer
Se você é a torre de noite
Estou a arder na tua mente espigão
Se você estiver na manhã maré
Sou o primeiro grito de pássaro
Se você é o cesto de laranjas
Eu sou a faca do sol
Se você é a pedra altar
Eu sou a mão sacrílego
Se estiver a dormir terras
Estou a cana crua
Se você é o vento do salto
Estou enterrado o fogo
Se estiver a água da boca
Eu sou a boca de musgo
Se estiver a floresta das nuvens
Eu sou o machado que lhe peças
Se você é a cidade profanada
Eu sou a chuva da consagração
Se você é o amarelo montanha
Estou a braços da liquen vermelho
Se você é o sol nascente
Estou a caminho de sangue




~~

13 outubro 2008

Amor e Arte

Liv Ullmann, atriz e diretora de cinema e Ingmar Bergamn, diretor de cinema.

"Certa vez disse a Ingmar que ele era "um genio", enquanto que eu era simplesmente "um talento". A reação dele foi uma metáfora musical que nunca esqueci: "Você é meu Stradivarius". Foi o mais belo que alguém me disse".

Ai se sesse...

12 outubro 2008

Poema dadaísta

PARA FAZER UM POEMA DADAÍSTA

Pegue num jornal.
Pegue numa tesoura.
Escolha no jornal um artigo com o comprimento que pretende dar ao seu poema.
Recorte o artigo.
Em seguida, recorte cuidadosamente as palavras que compõem o artigo e coloque-as num saco.
Agite suavemente.
Depois, retire os recortes uns a seguir aos outros.
Transcreva-os escrupulosamente pela ordem que eles saíram do saco.
O poema parecer-se-á consigo.
E você será um escritor infinitamente original, de uma encantadora sensibilidade, ainda que incompreendido pelas pessoas vulgares.






Tristan Tzara, pseudónimo de Sami Rosenstock, nasceu na Roménia em 1896. É especialmente conhecido por ter sido um dos fundadores e principais teóricos do movimento Dada. São da sua autoria os principais manifestos da «revolução dádá», levada a cabo, primeiro, em Zurique e, posteriormente, em Paris. Nesses manifestos encontramos, provavelmente, os mais importantes contributos poéticos de Tzara. A defesa de um (anti)discurso essencialmente revolucionário, assente num nihilismo de base, com repercussões estéticas e políticas, são alguns dos princípios aí defendidos. Mais tarde, em 1930, abandonou a atitude avassaladora dádá em prol de um surrealismo eminentemente político. Aliou-se à Resistência francesa e ao Partido Comunista durante a II Grande Guerra, tendo-se tornado cidadão francês em 1947. Em 1956 abandonou o comunismo, em sinal de protesto contra ações perpetradas pelo regime estalinista. Morreu em Paris, no dia 25 de Dezembro de 1963.

Sobre a Arte


Arte

Variações sobre o tema


Não existe uma única definição sobre Arte, mas sabemos reconhecer os critérios para identificar o que é Arte, reconhecer por exemplo, que Mona Lisa, ou a nona sinfonia de Beethoven, ou a Quernica de Picasso, são obras de Arte, todo mundo sabe. São com estas observações que o ensaísta Jorge Coli introduz no livro “ O que é Arte”, para nos fazer pensar e avaliar sobre o significado da arte. .
Suponho que se deva concordar plenamente com a dificuldade na definição sobre Arte, e para além de qualquer intenção específica que a arte possa ter, há sempre comunicação de alguma nova experiência, ou uma nova compreensão do já conhecido, ou a expressão de algo que experimentamos e para o qual não temos palavras – e ao localizar a emoção que um pintura suscita em nós, ela pode ampliar nossa consciência, apurando nossa sensibilidade. E nisto compreendo, creio eu, tanto o prazer que a arte pode proporcionar, quanto a diferença que, para além do prazer, ela pode oferecer à vida. E caso não se obtenham esses parâmetros, simplesmente não há arte.

A arte têm limites imprecisos, transformações, mutações: um espectro e variações infinitas. Artistas que como Marcel Duchamp revolucionaram a linguaguem do que seja a arte, com o seu famoso e irreverente vaso sanitário de louça exposto num museu, que com o seu discurso revolucionou o papel do objeto artístico, precisam integrar a esse novo e diletante tema sobre Arte .

Para decidir o que é ou não arte, nossa cultura utiliza o discurso sobre o objeto artístico, realizado pelo crítico, historiador, o conservador de museu, e os locais onde este objeto deve permanecer., mas o estatuto da arte não parte apenas destas definições abstratas, lógicas ou teóricas, mas de atribuições feitas por instrumentos de nossa cultura, fornecendo uma hierarquia dos objetos considerados ;”obra-primas”

30 setembro 2008

As aventuras de Arnaldo Rocha

AVENTURAS DE ARNALDO ROCHA - ELÉCTRICO 15

Como dizia Santo Agostinho, o tempo não existe: o passado já passou; o futuro ainda não chegou; o presente acabou de passar. Arnaldo Rocha é um agente especial da poderosa “Organização” que tenta, desesperadamente, criar o “Quinto Império”, a união do norte e do sul, do leste e do oeste. Arnaldo Rocha percorre o tempo atrás do mito.Publicação simultânea, em episódios, no Brasil (“Varal de Ideias”) e em Portugal (“Expresso da Linha”), todas as terças e sextas feiras.
EPISÓDIO V (continuação)
O núcleo central do Castelo de São Jorge, o castelejo, assenta na antiga construção mourisca que Afonso Henriques tomou em 1147, quando Lisboa era Ashbouna, capital do Alto Gharb. É um polígono quadrangular com muralhas de dez metros e uma dezena de torres. Do lado noroeste, a muralha prolonga-se num esporão que desce a encosta até à Torre de S. Gonçalo, cuja base se apoia na Rua Costa do Castelo.12,30h. Arnaldo abandona a esplanada do Castelo e entra no restaurante “Pátio dos Leões”. Gotas pesadas de chuva prenunciavam a tempestade fatal. Num banco de jardim, um casal vestido de cabedal negro, capacetes de mota no regaço, simulava beijos enamorados, enquanto olhavam de soslaio as deambulações de Arnaldo.Abóbadas a perder de vista. Sala cinzenta em luz de xisto. Janelas em ogiva panorâmica deslumbram-se sobre o Tejo.Mesa sete. Mestre V. Homem de aparência contida. Cara oval, óculos dourados na ponta do nariz judeu. Tinha acabado de tomar a bica. Dizia-se ainda descendente de Mestre Boaca, primeiro arquitecto dos Jerónimos, despedido por razões obscuras por D.Manuel I.“Quando venho para estas missões”, começou com voz pausada e clara, “almoço sempre primeiro… Não quero problemas de colite. Sente-se meu caro Arnaldo. Recomendo-lhe o bacalhau, está óptimo”.Nesse preciso instante a tempestade rebenta. Trovões e relâmpagos, rasgam o céu por entre cascatas de água em fúria. Ao longe, as colinas da Trafaria, Lazarete e Almada brilham nos raios que incendeiam a “ponte vermelha”, que treme de pavor.O bacalhau veio finalmente, trazido por um empregado que mais parecia comendador. Arnaldo, ainda encharcado, queixa-se de sinusite, assoando-se abundantemente.Só então Mestre V voltou a falar: “A tua missão está carregada de espinhos. Todos querem o teu falhanço. Não tens amigos. Ninguém te vai proteger… Ouve com atenção, só direi isto uma vez!Sempre houve grandes cataclismos. O mundo foi muitas vezes destruído. O mundo precisa de se renovar. Em tempos remotos, depois do grande dilúvio que encheu os mares e destruiu a civilização atlante, o neto de Noé, Túbal, aportou na actual Setúbal, tendo-se tornado no mais poderoso rei da península. Com ele chegou também o sobrinho Elysa, que terá fundado Lisboa e dado o nome aos celestiais Campos Elísios. Só muito depois os Fenícios chamaram a Lisboa Alis Ubbo e os romanos Felicitas Julia.Sempre houve uma cruz, que percorreu todos os cataclismos… Uma cruz com todos os poderes do mundo. Durante milénios a busca prosseguiu, sem sucesso. Só há uma verdadeira cruz redentora. Sempre esteve em Lisboa, trazida por Elysa. Procura-a… Encontra-a, antes do próximo dilúvio. Essa é a tua missão”.Arnaldo comia calmamente o bacalhau cozido, acompanhado por dois dedais de vinho tinto (nunca exagerava em serviço). Também já estava habituado a estes discursos dos “emissários do fim do mundo”. Na sede da “Organização”, tinha frequentado um curso semestral sobre escatologia avançada e aulas práticas sobre os dias do apocalipse.Lá fora o céu desfazia-se em água, enquanto relâmpagos descarregam electrões sobre Lisboa que explode em átomos de todas as cores.Mestre V. continuava indiferente: “Procura a cruz orbicular, a dupla hélice, as duas suásticas cruzadas, a cruz do movimento perpétuo, símbolo da totalidade do Cosmos, harmonização dos quatro elementos… Procura a cruz universal!”.O silêncio caiu subitamente. O restaurante estava vazio. Arnaldo sentiu um arrepio digno de “Quinto Império”. Mestre V. suspirou. “Arnaldo, só tu nos podes salvar. Só tu podes encontrar a Vera Cruz. Procura na Custódia e segue o trilho da cruz que se quebrou. Agora foge depressa, enquanto a tempestade te protege. Corre… Já cometes-te demasiados erros. Estás a ficar velho… Vai, vai, corre. Que os corvos não te alcancem!”.Arnaldo pressentiu o perigo. Saltou da mesa. Precipitou-se na intempérie. Virou à direita e correu em direcção à Torre de S. Gonçalo. Escorregou nos degraus moídos por pés seculares de gigantescos conquistadores. Ouviu duas balas que, tangentes, lhe pouparam o cérebro. Atirou-se para a escada de alumínio que o levou dez metros abaixo, novamente ao “Ninho das Águias”, conforme prévia combinação com o velhote da recepção. A Torre de S. Gonçalo confina, a oeste, com a residencial. A fuga fora prevista. Sentiu-se novamente jovem, embora ligeiramente febril.Puxou a escada e correu pela esplanada dos maracujás. Pela última vez, olhou curioso os papagaios que, finalmente, pareciam desinteressados.Desceu, tropeçando, os 38 degraus e viu-se novamente na rua bombardeado por toda a chuva do universo.Virou em direcção ao “Teatro Taborda”. Desceu os três andares num ápice e saltou para a “vereda tropical”, de cuja existência só na véspera soubera.Derrapou no pânico verde da erva encharcada e aterrou de cócoras na Rua da Saudade. Cruzou as escavações do Teatro Romano, quase invisível na cortina de chuva. Continuou correndo vielas abaixo… Só parou à vista da Sé.
(continua na 6ª feira)
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AVENTURAS DE ARNALDO ROCHA - ELÉCTRICO 15
Como dizia Santo Agostinho, o tempo não existe: o passado já passou; o futuro ainda não chegou; o presente acabou de passar. Arnaldo Rocha é um agente especial da poderosa “Organização” que tenta, desesperadamente, criar o “Quinto Império”, a união do norte e do sul, do leste e do oeste. Arnaldo Rocha percorre o tempo atrás do mito.Publicação simultânea, em episódios, no Brasil (“Varal de Ideias”) e em Portugal (“Expresso da Linha”), todas as terças e sextas feiras.
EPISÓDIO IV (continuação)
Àquela hora, naquela chuva, decidiu-se pelo restaurante do “Teatro Taborda”, ali a cinquenta metros. Novamente desce os 38 degraus, agora com aquela mulher exótica, com quem quase não falara e, no entanto, a quem tudo dissera… Os papagaios agitam-se, definitivamente curiosos.Cá em baixo, enfrentam a tempestade, enquanto se ouvem barcos uivando desesperadamente no Tejo que se adivinhava lá ao fundo, mas parecia estar em todo lado.Viraram à direita, rumo ao “Teatro Taborda”. Ao nível da rua, apenas a sala de entrada. Depois, o edifício branco e estreito desliza suavemente pela encosta.No andar mais abaixo, o restaurante. Meia dúzia de mesas à luz de velas, romanticamente esperando comensais ensopados. Para norte, vista poderosa sobre o Convento da Graça. Para sul, vista descendente até ao rio. Lisboa inteira estava ali… e ela também.Lá fora, a chuva cai, cai sempre. O caril era do Paquistão… O vinho de Óbidos… A empregada brasileira… Os proprietários alemães… As palavras de circunstância!Ao fundo, uma porta dá para uma rampa exterior que conduz a um descampado, uma espécie de “vereda tropical” que, por entre silvas e canas da Índia, vai descendo até ao Teatro Romano e daí até à Sé. Esgotos em queda livre e drogados injectando-se a céu aberto, completam a paisagem.A conversa mantinha-se fraca. Arnaldo não sabia o que dizer. Sempre fora tímido com mulheres. Apetecia-lhe mexer… apalpar. O caril excitava os sentidos. De repente, ela dá-lhe a mão e aperta com força. O jantar acaba logo ali!Ele deixa algumas notas em cima da mesa, suficientes para pagar três jantares e precipitam-se para a saída.Segundos depois sobem os 38 degraus de um só fôlego. Os papagaios mal têm tempo de exercitar a curiosidade.Irrompem pelo quarto já semi-nus e assaltam a cama com violência. As bocas penetram-se fundo, até o beijo se transformar em atentado ao pudor… Os corpos enrolam-se até o suor ser um só… As paredes não contêm tantos gritos de prazer. Ao fim de duas intensas horas, Arnaldo adormece exausto, agarrado a um corpo de quem não sabe o nome.Dorme de um só sono. Acorda às 8 horas com ligeiro catarro e, como era de prever, ela não estava lá!A porta envidraçada que dá para o jardim está entreaberta. Os papagaios gritam desvairados. A mulher da janela em frente faz-lhe sinal para fuga imediata.Arnaldo Rocha percebe que cometera demasiados erros. Está a ficar velho… quiçá senil.Toma banho frio para revigorar e, pela primeira vez, espirra. Veste-se às três pancadas e precipita-se para a recepção. Conferencia baixo com o velhote, que vai assentindo com a cabeça. Paga a conta e deixa-lhe uma pauta de cem no aperto de mão final.Desce novamente os 38 degraus. Os papagaios olham-no, agora críticos.Cá em baixo vira à esquerda, em direcção ao Castelo. A chuva tinha parado momentaneamente. O sol vinga-se brilhando esfuziante por entre nuvens negras entumescidas pela tempestade que teima em se aproximar. O branco das paredes corroi-lhe as pupilas crispadas de cansaço.Arnaldo foi andando, desconfiado de tudo e de todos. À entrada do Largo dos Loios, virou à esquerda por uma rua íngreme. Entrou no Castelo. Decidira misturar-se com a multidão de turistas até à hora do almoço… até ao encontro com Mestre V.
(continua na terça feira)
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AVENTURAS DE ARNALDO ROCHA - ELÉCTRICO 15
Como dizia Santo Agostinho, o tempo não existe: o passado já passou; o futuro ainda não chegou; o presente acabou de passar. Arnaldo Rocha é um agente especial da poderosa "Organização" que tenta, desesperadamente, criar o "Quinto Império", a união do norte e do sul, do leste e do oeste. Arnaldo Rocha percorre o tempo atrás do mito.
Publicação simultânea no Brasil ("Varal de Ideias") e em Portugal ("Expresso da Linha") todas as terças e sextas feiras.
EPISÓDIO III (continuação)
Arnaldo Rocha abre a mala recebida no aeroporto. Um estojo com material de higiene; uma muda completa de roupa; uma “Beretta” e um coldre de ombro; uma pequena máquina fotográfica digital e um envelope azul lacrado com o símbolo do “abraxas”. Rompe o lacre. Mensagem curta e concisa: “22 horas. A.R.C.O., Professor B”.Olhou o relógio. 9,45. Corre a tomar banho. Faz a barba. Veste-se de lavado. Não esquece o revólver.9,40. Desce os 38 degraus da escada em caracol. A jovem mulher mantinha-se vigilante no seu posto. Os papagaios olham-no, novamente curiosos.A chuva persiste num dilúvio bíblico, como se todo o Atlântico tivesse decidido despejar-se sobre Lisboa. Arnaldo começa a sentir-se febril.A rua estava deserta. Arnaldo virou à esquerda, em direcção ao Largo dos Loios. A água começa a engrossar. Regatos caiem desamparados pela encosta abaixo.Largo dos Loios. A.R.C.O… O Professor B esperava-o no corredor de entrada, rodeado de provocantes alunas. Pega-lhe no braço e arrasta-o para um canto escuro: “Amanhã. 12,30h. Restaurante “Pátio dos Leões”, Castelo de São Jorge. Mesa sete. Mestre V”… E rapidamente volta às suas alunas.Arnaldo Rocha regressa apressado à segurança do “Ninho”. Cinco minutos depois está de novo a subir os 38 degraus. Lá em cima os papagaios olham-no cada vez mais curiosos.Na recepção o velhote entrega-lhe a chave com um discreto aceno de cabeça em direcção à sala de estar.Sala pequena, com um par de sofás e uma televisão, onde depois do jantar a família de retornados*, proprietária da residencial, se reúne para ver telenovelas.Ela estava lá, sentada a um canto, sorrindo despudoradamente. Mais uma vez teve a certeza de a conhecer de qualquer missão anterior. Não resistiu. Convidou-a para jantar… Este foi o seu segundo erro!
*Retornado: designação genérica dada a pessoas, normalmente brancos, que, depois da independência das colónias, regressaram a Portugal. Foram cerca de 600 000.
(CONTINUA NA SEXTA-FEIRA, 26/9)
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AVENTURAS DE ARNALDO ROCHA - ELÉCTRICO 15
Como dizia Santo Agostinho, o tempo não existe: o passado já passou; o futuro ainda não chegou; o presente acabou de passar.
Arnaldo Rocha é um agente especial da poderosa "Organização" que tenta, desesperadamente, criar o "Quinto Império", a união do norte e do sul, do leste e do oeste. Arnaldo Rocha percorre o tempo atrás do mito.
Publicação simultânea no Brasil ("Varal de Ideias") e em Portugal ("Expresso da Linha"), às terças e sextas feiras.
EPISÓDIO II (continuação)
Lá fora chove. Chove muito. Chove sobre tudo … e sobretudo chove. Arnaldo Rocha entra húmido no táxi. “Para a Residencial Ninho das Águias”, indica ao condutor. O táxi segue pela Avenida do Aeroporto e enfia pela Almirante Reis abaixo. Ao fundo, chegando ao Martim Moniz, viramos à esquerda pela Calçada dos Cavaleiros. Rua sinuosa e estreita, marcada pelos trilhos de eléctrico. Numa curva apertada à esquerda, a Rua do Bem Formoso levar-nos-ia ao Intendente com a sua nova geração de desgraçados. Mais acima, voltamos definitivamente à direita pela Costa do Castelo, rua apertada entre casas e carros mal estacionados, que nos deixa no número 74: a “Residencial Ninho das Águias”.A penumbra adensa-se na noite lisboeta. A chuva mantém-se inclemente. Pingos de água caem como pérolas, esmagando-se no asfalto negro. São nove horas. O táxi parte, deixando Arnaldo com a mala castanha frente a uma porta aberta para dentro de um muro cinzento sem limites.Entra para um saguão mal iluminado e estreito, quase um poço. Sobe trinta e oito íngremes degraus de uma escada em caracol, que o leva ofegante até nova porta agora fechada. Toca… Ao lado, dois papagaios residentes numa gaiola incrustada na parede olham-no com curiosidade.A porta abre-se automaticamente e, novamente, enfrenta a chuva imparável.O “Ninho das Águias” eleva-se em frente. Uma velha moradia, tipo “chalet”, em azul bébé. Dois andares, culminados num minarete redondo que domina Lisboa inteira. No jardim, uma esplanada de maracujás sobrevoa o casario desencontrado que, ao longe, se despenha na vertigem das sete colinas opacas de neblina.Ao fundo, lá em baixo, a mole enorme do Hospital de S. José, com a habitual procissão de ambulâncias uivando à tempestade, no afã de entregar despojos humanos na urgência da noite.Arnaldo corre encharcado até à entrada da pensão. Sobe três degraus. Cumprimenta o velhote que cabeceia na estreita recepção encimada por duas águias empalhadas. Recebe, como de costume, a chave do quarto número sete e, sem mais formalidades, retira-se para os seus aposentos.Pé direito altíssimo. Paredes de tabique. Ao meio uma cama enorme, que talvez desse para três pessoas. Uma cómoda e um roupeiro rudimentares. Quadros com paisagens africanas. Dois candeeiros prateados de pé alto, projectando para o tecto, um de cada lado da cama, qual “boite” dos anos cinquenta. Uma porta envidraçada dá directamente para o jardim, permitindo fuga rápida em caso de necessidade.Na casa ao lado, a luz acesa de uma janela sem cortinas deixa ver uma mulher jovem debruçada sobre o teclado de um “lap-top”.Arnaldo aproxima-se da porta envidraçada e olha para o quarto em frente, onde a jovem mulher continua o seu ritual computorizado. De repente a janela apaga-se duas vezes. Sinal combinado. A missão pode continuar…
(continua na 3ª feira)
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16.9.08

AVENTURAS DE ARNALDO ROCHA - ELÉCTRICO 15
Como dizia Santo Agostinho, o tempo não existe: o passado já passou; o futuro ainda não chegou; o presente acabou de passar.
Arnaldo Rocha é um agente especial da poderosa "Organização" que tenta, desesperadamente, criar o "Quinto Império", a união espiritual do norte e do sul, do leste e do oeste. Arnaldo Rocha persegue o tempo atrás do mito...
Nota 1: Arnaldo Rocha ou Cavaleiro de Gondemar, oriundo de Portugal ou da Galiza, é um personagem histórico que terá sido um dos membros fundadores da Ordem dos Templários, em 1118. Tudo o resto nestas histórias que hoje se iniciam é ficção.
Nota 2: as "Aventuras de Arnaldo Rocha" são cinco histórias divididas por episódios, e serão publicadas todas as terças e sextas feiras, em simultâneo, em Portugal, no "Expresso da Linha" e no Brasil, no "Varal de Ideias". EPISÓDIO I
“Senhores passageiros, estamos a iniciar a descida para o Aeroporto Internacional de Lisboa. São 19 horas locais. O tempo está chuvoso e a temperatura é de 17 graus centígrados. O comandante Paulo Sérgio deseja que tenham feito uma boa viagem a bordo do nosso Airbus 320 e espera vê-los proximamente nos voos da TAP”.Poucos minutos depois o avião aterrou suavemente na humidade pegajosa do Inverno lisboeta.Sentado nas filas traseiras, um homem de estatura mediana, excessivamente magro, entradas pronunciadas, óculos “Armani” e idade indefinida, levanta-se calmamente. Veste uma gabardina clara, que o torna ainda mais esguio. Sem pressa, deixa que o avião se vá esvaziando. Sai sem bagagem, misturado com um grupo ruidoso em turismo de terceira idade.Ao passar pela tripulação não repara que a chefe de cabina o segue intensamente com o olhar enquanto ele percorre a manga de saída. Também não a vê enviar, subrepticiamente, uma curta mensagem pelo telemóvel: “O homem chegou”.À volta dos tapetes rolantes uma turba expectante aguarda, impaciente, a chegada das malas. O homem da gabardina colocou-se estrategicamente à saída das bagagens. De repente, com movimento rápido, retira uma mala pequena, castanha escura. Move-se com agilidade por entre a multidão. Entra numa casa de banho da parte antiga da sala de chegadas e fecha-se nos lavabos. Com gestos precisos retira a etiqueta presa à asa da mala e guarda-a no bolso da gabardina. Põe os pés em cima da sanita, afasta uma placa do tecto falso e esconde a mala. Quem mais tarde a encontrar, verificará que ela apenas contém jornais velhos.Veste a gabardina ”double face” do lado castanho e põe um chapéu mole de “tweed” esverdeado. Quando regressa ao tapete é outro homem. Ninguém repara nele. Aguarda pacientemente que o tapete se imobilize e, juntamente com mais seis pessoas, dirige-se para o serviço de “lost and found” para reclamar perda de bagagem.Os “perdidos e achados” ficam lá em baixo, bem encostados ao fundo da parte renovada da sala de chegadas que, entretanto, se vai lentamente esvaziando.O nosso homem entra no apertado cubículo, onde se ouve reclamar em vários idiomas. Passageiros exaltados por entre o permanente marulhar do telex e um irritante telefone agudo que ninguém parece interessado em atender.Lá de dentro sai uma mulher madura com ar de quem detém posição graduada. Rosto felino, lábios fartos, boca devastadora, seios arrojados… vagamente italiana. Faz-lhe um discreto sinal. Ele aproxima-se. Ela pergunta-lhe o nome. “Arnaldo Rocha”, responde. “A sua mala veio no voo anterior”, diz-lhe ela com voz profissional e manda-o entrar para dentro do terminal de bagagem, longe dos olhares de passageiros e funcionários.Sem uma palavra, ele entrega-lhe o talão que retirara da mala escondida no W.C. As mãos roçam levemente e ele tem a certeza de a conhecer de uma qualquer missão anterior. Ela levanta uma mala castanha escura, idêntica à anterior. Coloca habilmente o “ticket” que acabara de receber e entrega-lha.Ele encara-a de frente e antecipa-lhe nos olhos o êxtase do orgasmo. Não resiste. Sussurra-lhe a morada onde vai ficar… Este foi o seu primeiro erro!
(CONTINUA na 6ªFeira, 19/9)
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28 setembro 2008

Curiosidades

UM BATE PAPO INFORMAL E DESPRETENSIOSO SOBRE INFORMÁTICA E OUTROS TEMAS CORRELACIONADOS.


Humor de sexta-feira: Ditados populares
Como estamos na 'Era Digital', é necessário rever velhos ditados e adaptá-los a esta nova realidade. Vejamos alguns:

1. A pressa é inimiga da conexão.
2. Amigos, amigos, senhas à parte.
3. Antes só, do que em chats aborrecidos.
4. A arquivo dado não se olha o formato.
5. Diga-me que sites freqüentas e dir-te-ei quem és.
6. Para bom provedor uma senha basta.
7. Não adianta chorar sobre arquivo deletado.
8. Em briga de namorados virtuais não se mete o mouse.
9. Em terra off-line, quem tem 486 é rei.
10. Hacker que ladra, não morde.
11. Mais vale um arquivo no HD do que dois baixando.
12. Mouse sujo se limpa em casa.
13. Melhor prevenir do que formatar.
14. O barato sai caro. E lento.
15. Quando a esmola é demais, o santo desconfia que tem vírus anexado.
16. Quando um não quer, dois não teclam.
17. Quem ama um 486, Core2Duo lhe parece.
18. Quem clica seus males multiplica.
19. Quem com vírus infecta, com vírus será infectado.
20. Quem envia o que quer, recebe o que não quer.
21. Quem não tem banda larga, caça com modem.
22. Quem nunca errou, que aperte a primeira tecla.
23. Quem semeia e-mails, colhe spams.
24. Quem tem dedo vai a Roma.com
25. Um é pouco, dois é bom, três é chat ou lista virtual.
26. Vão-se os arquivos, ficam os back-ups.
27. Há dois tipos de usuários de PCs: os que já perderam um HD e os que ainda vão perder...
28. Uma impressora disse para outra: essa folha é sua ou é impressão minha?
29. Aluno de informática não cola, faz backup.
30. O problema do computador é o USB (Usuário Super Burro).
31. Na informática nada se perde, nada se cria; tudo se copia... e depois se cola.
32. O Natal das pessoas viciadas em computador é diferente: dia 25 de Dezembro, Papai Noel desce pelo cabo de rede, sai pela porta serial e diz: Feliz Natal, ROM, ROM, ROM!

24 setembro 2008

Nas sombras de Goya

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Na sombra de Goya

Espanha do século XVIII, em meio ao radicalismo religioso e à iminente invasão das tropas napoleônicas, onde Francisco Goya trafega com o seu talento. Inicialmente, criando retratos da família real do Rei Carlos IV, com a comovente história de Inês Bilbatua, musa do pintor e retratada por ele em palácios e igrejas, onde neste período é cruelmente presa e torturada, sob a falsa acusação de heresia.
Goya recorre ao influente Frei Lorenzo, pretensamente seu amigo, sem saber que estava lidando com um dos próprios líderes da inquisição.
Filme baseado em fatos reais, uma superprodução dirigido por Milos Forman ( o mesmo de Amadeus), com uma fotografia deslumbrante e com o primor das gravuras de Goya como planos nas cenas. Filme de personagens intensos, vivendo os horrores de uma guerra que estão vivamente representados nos quadros de Goya, como testemunha de sua época.
Não é propriamente um filme autobiográfico, mas de intensos momentos vividos pelo grande pintor.


20 setembro 2008

Amor e Arte

Anais Nin e Henry Miller
Anais (1930-1977), foi amante de Henry Miller, e ficou famosa por escrever diários pessoais,
e contos eróticos.
Durante a década em que foram amantes, nenhum foi "fiel" ao outro, mas a união física e artística era primordial. Nesse período criaram suas melhores obras.
Escreveram cartas enormes um ao outro esponencialmente.
Ele escreveu Tropic of Cancer, Tropic of Capricorn e
Black Spring, e empreendeu uma pesquisa profunda sobre
Lawrence.

14 setembro 2008

Solidariedade


solidariedade


so.li.da.rie.da.desf (solidário+e+dade) 1 Qualidade de solidário.
2 Estado ou condição de duas ou mais pessoas que repartem entre si igualmente as responsabilidades de uma ação, empresa ou de um negócio, respondendo todas por uma e cada uma por todas.
3 Mutualidade de interesses e deveres.
4 Laço ou ligação mútua entre duas ou muitas coisas dependentes umas das outras.
5 Dir Compromisso pelo qual as pessoas se obrigam umas pelas outras e cada uma delas por todas.
6 Sociol Condição grupal resultante da comunhão de atitudes e sentimentos, de modo a constituir o grupo unidade sólida, capaz de resistir às forças exteriores e mesmo de tornar-se ainda mais firme em face da oposição vinda de fora.
S. ativa, Dir: solidariedade em que cada um dos credores da mesma obrigação pode exigir do devedor não somente a sua parte da dívida, mas também a dos demais.
S. orgânica, Fisiol: relação necessária que se estabelece entre um ato da economia e outro diferente que se produz em ponto muito afastado.
S. passiva, Dir: aquela em que cada um dos devedores de um mesmo título responde pela soma total da dívida.
S. social: consistência interna de um agregado social; coesão social.
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09 setembro 2008

Os espelhos

Os espelhos

O que é um espelho? Não existe a palavra espelho – só espelhos, pois um único é uma infinidade de espelhos. Em algum lugar do mundo deve haver uma mina de espelhos?
Não são preciso muitos para se ter a mina faiscante e sonambúlica: bastam dois, e um reflete o reflexo do eu o outro refletiu, num tremor que se transmite em mensagem intensa e insistente ad infinitum, liquidez em que se pode mergulhar a mão fascinada e retira-la escorrendo de reflexos, os reflexos dessa dura água.
O espelho é o espaço mais fundo que existe – É coisa mágica: quem tem um pedaço quebrado já poderia ir com ele meditar no deserto. De onde também voltará no vazio, iluminado e translúcido – e com o mesmo silêncio vibrante de um espelho.

Quem olha um espelho conseguindo ao mesmo tempo isenção de si mesmo, quem consegue vê-lo sem se ver, quem entende que a sua profundidade é ele ser vazio, quem caminha para dentro de seu espaço transparente sem deixar nele o vestígio da própria imagem – então percebeu o seu mistério.”

Clarice Lispector < “Para não esquecer” (Rio de Janeiro, 1999, p-12-13) Texto modificado e resumido.

05 setembro 2008

@ Leituras


Mia Couto: escritor Moçambicano, faz em " O Outro Pé da sereia" uma polifonia, uma invenção a duas vozes: uma parte se passa no século 17, com a sereia, no passado das navegações, interligadas a uma história do século 21.
A profundidade e a beleza da narrativa, cheia de poesia e de imagens desconcertantes, e a capacidade de inverter o pensamento do leitor, são características de Mia Couto.

A história é sensacional: a relação de Mwadia, que tem corpo de rio e nome de canoa, e Zero, que tem em seu pescoço cicatrizes que ele diz serem guelras, herança da metade de sua alma que é peixe.

Mia Couto nos traz a aculturação, crenças, mistérios, a busca de identidades, as referências a colonização africana, como ingredientes imperdíveis deste romance.

Altamente recomendado.



Leituras





Recentemente li o "Cavalo Perdido e outras histórias de Felisberto Hernandes" Poeta Uruquaio (1902-64), contemporâneo de Borges e Onetti. Livro prefaciado por Julio Cortázar e com comentários de Ítalo Calvino. Além de escritor, Felisberto foi pianista, realizando numerosas viagens, apresentando concertos no interior de seu país.
Uma leitura deliciosa, onde há planos intricados em sua fala. Ele reconstrói a realidade com as asssociações de idéias dos sonhos e da memória. Faz um jogo de cadência de frases musicais que seduz e alerta-nos para coisas inusitadas, para objetos do cotidiano esquecidos e abandonados.
Abarca os planos de sua narrativa com outros planos. Cria novas estruturas oníricas de seu imaginário, cruza dimensões das percepções inesperadas, e volta a inserir no real.














Ju Gioli


22 agosto 2008

Pas-s-ages







fron



t eiras ( silenciação










( 3 tarde 3

tardes 3 terra de chão grão calado ( tri circu lar

alimento ( 6 olhos quilha 1

nave gar rio que ferve ouro que ferve larvar

( caldos de chuva maçãs temp erar

cheiro de fonte bicho de pirilampar )

eco volátil in cubo postigo

varro que varro

tender massas ama ss ar

con fiante en xuta in teira ex austa

rocas de linho madrinhas de fadas que invente

a in vent ar



( ja nelas de de cantar reza 1 feitiço 3

) dou-me dai-me ai

a serenidade

a memória das mãos

sopas de pedra gestos de flor na boca sais

manhã que creia tri pés madeiras dias tisnados

de sempre iguais



arran cai-me às trevas de ver



re colhei-me ( cerrada de olhos



acolai - me fria em xaile quente

a a prender-vos )( calai-me

) sopr ai-me gestos de flor anjos orações intermináveis

penedos mouras trombetas finais

revelai-me o mistério das sementes pequenas

soprai-me as raízes de línguas a vir

in suflai cega mente a luz da cegu eira

atai-me ao silêncio dos gritos finais










~






in~ ~pi

06 julho 2008

Portas



Os jornais e os operários

Antonio Gramsci (1891-1937)

É a época da publicidade para as assinaturas. Os diretores e os administradores dos jornais burgueses arrumam as suas vitrines, passam uma mão de tinta pela tabuleta e chamam a atenção do passante (isto é, do leitor) para a sua mercadoria. A mercadoria é aquela folha de quatro ou seis páginas que todas as manhãs ou todas as tardes vai injetar no espírito do leitor os modos de sentir e de julgar os fatos da atualidade política que mais convêm aos produtores e vendedores de papel impresso. Estamos dispostos a discorrer, com os operários especialmente, sobre a importância e a gravidade daquele ato aparentemente tão inocente que consiste em escolher o jornal que se pretende assinar? É uma escolha cheia de insídias e de perigos que deveria ser feita com consciência, com critério e depois de amadurecida reflexão. Antes de mais, o operário deve negar decididamente qualquer solidariedade com o jornal burguês. Deveria recorda-se sempre, sempre, sempre, que o jornal burguês (qualquer que seja sua cor) é um instrumento de luta movido por idéias e interesses que estão em contraste com os seus. Tudo o que se publica é constantemente influenciado por uma idéia: servir a classe dominante, o que se traduz sem dúvida num fato: combater a classe trabalhadora. E, de fato, da primeira à última linha, o jornal burguês sente e revela esta preocupação. Mas a pior reside nisto: em vez de pedir dinheiro à classe burguesa para o subvencionar na obra de defesa exposta em seu favor, o jornal burguês consegue fazer-se pagar pela própria classe trabalhadora que ele combate sempre. E a classe trabalhadora paga, pontualmente, generosamente. Centenas de milhares de operários contribuem regularmente todos os dias com seu dinheiro para o jornal burguês, aumentando a sua potência. Porquê? Se perguntarem ao primeiro operário que encontrarem no elétrico ou na rua , com a folha burguesa desdobrada à sua frente, ouvirão esta resposta: “Porque tenho necessidade de saber o que há de novo”. E não lhe passa sequer pela cabeça que as notícias e os ingredientes com as quais são cozinhadas podem ser expostos com uma arte que dirija o seu pensamento e influa no seu espírito em determinado sentido. E, no entanto, ele sabe que tal jornal é conservador, que outro é interesseiro, que o terceiro, o quarto e quinto estão ligados a grupos políticos que têm interesses diametralmente opostos aos seus. Todos os dias, pois, sucede a este mesmo operário a possibilidade de poder constatar pessoalmente que os jornais burgueses apresentam os fatos, mesmo os mais simples, de modo a favorecer a classe burguesa e a política burguesa com prejuízo da política e da classe operária. Rebenta uma greve? Para o jornal burguês os operários nunca têm razão. Há manifestação? Os manifestantes, apenas porque são operários, são sempre tumultuosos, facciosos, malfeitores. O governo aprova uma lei? É sempre boa, útil e justa, mesmo se não é verdade. Desenvolve-se uma campanha eleitoral, política ou administrativa? Os candidatos e os programas melhores são sempre os dos partidos burgueses. E não falemos daqueles casos em que o jornal burguês ou cala, ou deturpa, ou falsifica para enganar, iludir e manter na ignorância o público trabalhador. Apesar disto, a aquiescência culposa do operário em relação ao jornal burguês é sem limites. É preciso reagir contra ela e despertar o operário para a exata avaliação da realidade. É preciso dizer e repetir que a moeda atirada distraidamente para a mão do ardina é um projétil oferecido ao jornal burguês que o lançará depois, no momento oportuno, contra a massa operária. Se os operários se persuadirem desta elementaríssima verdade, aprenderiam a boicotar a imprensa burguesa, em bloco e com a mesma disciplina com que a burguesia boicota os jornais dos operários, isto é, a imprensa socialista. Não contribuam com o dinheiro para a imprensa burguesa que vos é adversária: eis qual deve ser o nosso grito de guerra neste momento, caracterizado pela campanha de assinaturas, feitas por todos os jornais burgueses. Boicotem, boicotem, boicotem!

pesquisa e foto : JU Gioli

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