Modos de Ver a Arte
Parte II
Por Sergio Fingermann
“As pinturas entram, por meio de diversos tipos de impressão e reprodução em todos os lugares.
A unicidade da obra se partiu.
Não estão mais somente nas igrejas, castelos, museus.
Chegam às nossas casas também.
As pinturas são vistas em contextos diferentes.
O significado das pinturas diversifica-se.
Fragmenta-se.
Para melhor compreendermos, poderíamos exemplificar assim:
Temos uma reprodução da Monalisa, de autoria de Leonardo da Vinci.
O quadro veio até nós graças à reprodução mecânica.
Está em nossa casa.
Se pudéssemos nos deslocar até Paris, no Museu do Louvre, para ver aquele
Original e assim descobrir o que falta à nossa reprodução, certamente nos
Colocaríamos algumas questões:
Falta qualidade (quais?) na reprodução em relação ao original?
O que nos impressiona frente ao original?
Onde está seu significado?
Será que o significado se deslocou?
Será que aquilo que a pintura da Monalisa diz deslocou-se para o que ela é?
Onde está a coisa da pintura?
Desde o Renascimento, por um longo processo, vimos surgir profissionais periféricos aos artistas e seus trabalhos.
Numa lenta evolução, elaboraram-se figuras como historiadores de arte, críticos, marchands, colecionadores, jornalistas, especuladores, curadores, etc ...; Formam-se também conselhos e sociedades amigas das instituições que guardam e escrevem a memória da arte.
Reivindicam para si participação importante e poder na cena artística.
A arte contemporânea é mal aprendida pelo público porque ele está perdido em meio aos diferentes tipos de atividades artísticas.
Com os instrumentos de que dispõe, formados na modernidade, aqueles pressupostos que tinha adquirido sobre a arte ( tais como: beleza, gosto, forma, etc.) já não dão conta da fruição da experiência que a arte contemporânea propõe.
Aquele público que foi educado, que foi instruído ( já há tanto tempo) nos valores culturais da modernidade, encontra-se desamparado.
Faltam-lhe critérios para exercer o juízo crítico em relação ao que lhe apresenta como arte.
Observa-se que, mesmo excluído da compreensão dos fenômenos artísticos esse público mostra fidelidade aos eventos.
A indústria cultural tem funcionado bem.
Na nossa sociedade há um culto da arte.
Ela é a religião do homem de hoje.
Em nossa sociedade, a proximidade com a arte define a posição cultural e associa-se a um princípio de desenvolvimento.
O público é incitado a considerar a arte como elemento indispensável na vida contemporânea.
Nossa sociedade tornou-se uma sociedade cultural.
O imperativo agora é ser “criativo” e “produzir arte”
Visitando as grandes mostras de arte contemporânea, museus, galerias, exposições temporárias, observa-se uma homogeneização de tendências, reduplicando modelos, repetindo artistas.
Os centro de arte perderam o respeito ao pluralismo das tendências, às diversidades de expressão.
O caráter das mostras não aponta para individualismos, mas, o seu oposto, um conformismo geral e amalgamado.
Nosso receio é de termos perdido toda medida, todo julgamento e todos os valores.
Será uma decadência?
Será que precisamos utilizar um modelo diferente do que usamos na modernidade, ( período que vai do Impressionismo às Vanguardas) para captar a realidade contemporânea?
Que ventos respiramos no presente?
Será que a experiência artística se constrói somente em sua própria autoridade?
Se for isso, ela está muito próxima da fé religiosa e pronta a servir às ditaduras políticas.
Há um vazio de conteúdos.
Confunde-se experiência com realização.
Uma arte que, algumas vezes, parece desprezar a cultura.
Uma arte que, algumas vezes, transforma o anti-humanismo em programa de ação.
Uma arte que, algumas vezes, responde ao vazio com o vazio.
Quais são as responsabilidades dos artistas?
Sergio Fingermann é artista plástico. Realizou recentemente exposição na Pinacoteca do Estado de São Paulo e no museu Nacional de Artes Plásticas. É autor dos livros: Fragmentos de um dia extenso (2001) e Elogio ao silêncio (2007), São Paulo: Editora Bei.
~~~~~~~~~~~~